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Cultura do estupro

Vou escrever esse post com base em um artigo publicado na edição da revista Super Interessante em julho/2015, que você pode acessar clicando aqui.





“Uma em cada cinco mulheres será estuprada. No entanto, até as mais respeitadas instituições - escolas, igrejas, universidades, famílias - varrem a violência sexual para baixo do tapete. Por quê? E até quando?”




Essa reportagem, além de falar sobre um assunto importantíssimo, traz figuras excelentes que conseguem resumir em apenas uma imagem a cultura do estupro, que ainda é cercada pela polêmica “existir ou não existir, eis a questão”. Foi publicada na edição de julho de 2015, mas se encaixa perfeitamente no momento que estamos vivendo agora.

Talvez ainda esteja valendo daqui dois, cinco, dez anos… Mas a esperança é que logo ela seja apenas uma recordação de tempos animalescos em que um ser humano pensava-se dono de outros corpos.

Dados chocantes são apresentados ao longo do artigo nos fazendo refletir o absurdo que é não reconhecer a existência da cultura do estupro, andando lado a lado com o machismo e, tão intrincada na sociedade que se torna difícil reconhecer e fazer reconhecer.

“Todo mundo concorda que estupro é um dos piores crimes que existem. Ainda assim, 99% dos agressores sexuais estão soltos - e eles não são quem você imagina. Culpa de uma tradição milenar: o nosso hábito de abafar a violência sexual a qualquer custo.”




O primeiro dado chocante é que, até 2002, vigorava no Brasil uma lei que inocentava o estuprador caso ele se comprometesse a casar com a vítima!! Até abaixei a revista e fiquei refletindo depois de ler isso, não consigo acreditar, mesmo agora, depois de reler e reler, que existia uma lei tão absurda em meu país em pleno século XXI!

Junto com essa lei estarrecedora, lemos em um dos boxes da página ao lado, alguns procedimentos em relação ao estupro que vigoravam em tempos antigos (Código de Hamurabi, Bíblia - Velho Testamento e Roma Antiga) e que, novamente estarrecedor, não mudaram muito nos últimos quatro mil anos! A vítima sempre vista como culpada, tida como um objeto, física e psicologicamente ignorada.






Estupros são encobertos em todo o mundo, principalmente com mulheres e crianças em situação vulnerável, diante de grandes instituições, pessoas famosas ou “respeitáveis”. As vítimas são desacreditadas e desprezadas, até desistirem ou serem esquecidas pela sociedade. Das forças de paz da ONU, passando pelas igrejas até personalidades influentes, há casos de estupro silenciados.

Acrescentando a informação que 99% dos agressores sexuais não são punidos (dados dos EUA) temos uma ideia do quão difícil se torna pensar em denunciar uma agressão sexual. Além do trauma já sofrido, a vítima passará por uma nova fase de questionamentos e olhares tortos.

“Imagine que roubaram o seu celular e você decide fazer um B.O. Agora imagine que o delegado que pegou o seu caso resolve perguntar onde você foi assaltado, que horas eram e se você era conhecido por trocar de aparelho o tempo todo. Depois ele pergunta se você tem certeza de que o assalto realmente aconteceu ou se você não deu o celular ao bandido por vontade própria. Se você então explica que o roubo foi de madrugada e depois de você ter tomado umas cervejas, o delegado decide - por conta própria - que não houve crime algum: você estava na rua e bêbado, quem pode garantir que você está falando a verdade? Ou então, pior, quem disse que você não queria ter sido assaltado?”



Quando estupros são extremamente violentos, infligidos por desconhecidos armados que causam, além da agressão sexual, inúmeras marcas e/ou a morte da vítima, o caso toma proporções muito diferentes. Toda a sociedade toma a parte da vítima e o criminoso recebe a punição devida. O que deveria acontecer em, pelo menos, 99% dos casos de estupro, mas como visto acima, ocorre o oposto. Se a vítima não tem marcas de violência será difícil provar a agressão. Milhares de vezes mais difícil ainda será no caso de o estuprador ser conhecido da vítima.

Embora 60% a 65% das agressões sexuais sejam causadas por conhecidos da vítima*, o fato dela não ter marcas pelo corpo ou sinais de esperma faz com que a denúncia talvez nem se concretize!






Deveria haver um atendimento padronizado nos casos de agressão sexual, com funcionários qualificados para atender essas vítimas que já se encontram fragilizadas e reuniram muita coragem para dar o primeiro passo. Se a agressão foi recente e ainda apresenta marcas físicas, isso deve ser investigado com delicadeza, para não causar ainda mais trauma. E se a agressão é constante, vinda de um conhecido, a vítima não pode ser desacreditada sem maiores investigações, muito menos deve ser pressionada nesse momento delicado.

Não posso responder até quando isso acontecerá, mas espero que o tempo, os protestos e as divulgações ajudem a esclarecer o prejuízo desses crimes e transformar nossa sociedade em uma sociedade mais sábia.

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